quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Si mesmo e o outro: liberdade?



Kierkegaard, no Ponto de Vista, afirmava que o máximo que ele poderia fazer pelas pessoas era alertá-las, torná-las atentas; mais do que isso ele não poderia fazer, uma vez que a decisão é sempre individual. O convívio com o próximo sempre oferece essa possibilidade, ou seja, conduzi-lo a reflexão a fim de que se torne atento em relação as próprias escolhas. Mas o que se passa é que as coisas não se dão para todas as pessoas do mesmo modo. O outro, quando não consegue ver “possibilidade” acaba tornando necessário aquilo que futuramente poderá trazer conseqüências em prejuízo não apenas seu, mas também de seu próximo. É precisamente sob este aspecto que o instante da escolha é sempre decisivo. Nesse sentido não basta saber, depois de percorrer um caminho solitário, que a conquista da liberdade é sempre um percurso individual e que somente a partir disso é possível dizer: eu-mesmo. Por vezes o outro não dá passo, não consegue ver que isso que é de sua responsabilidade é do mesmo modo o que responsabiliza o outro. Enquanto próxima, sou sempre responsável. No entanto, esse outro, pessoa de meu semelhante que nem sempre consigo alertar, ainda assim me responsabiliza. Nesse irrefletido que é o outro surgem novas possibilidades de escolhas, mas tudo ocorre como numa repetição e isso também me torna responsável. Na “caverna”, ilusoriamente, tudo parece mais tranqüilo; na irreflexão o olho é apenas físico, pois ele olha e não vê. Como uma névoa que encobre toda a cor e o brilho que há nas coisas, oculta aquilo que ainda não é simplesmente por que não tornou-se. Angústia: não posso fazer ver pelo outro. Liberdade: talvez, esse "deixar ver" seja apenas vontade, desejo, prepotência.
Nesse emaranhado de contradições, o dito está sempre além dele mesmo e a palavra segue solitária e incompreendida.
Em meio aos meus pensamentos sou conduzida a uma reflexão de Jean-Yves, A Sabedoria do Salgueiro, quando pronuncia: "Dit ce qu'il est, ce que le soufle lui inspire, sachant que ses paroles pourront être plus ou moins bien interprétées selon l'oreille de cellui qui écoute..." (p.56) Essa é a condição.
Apesar disso, sempre e a todo o instante, diante do outro estou plena de possibilidades. Nessa busca incomensurável o primeiro impulso é sempre egoísta; o eu deseja outra coisa senão a si próprio, pois todo o gozo quer ele mesmo...
mas,
eis que a liberdade fala mais alto perguntando em silêncio: e o outro que te responsabiliza? Acaso não te tornaste por ele responsável?
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"Disciplina é liberdade, compaixão é fortaleza, ter bondade é ter coragem." (Renato Russo)
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