segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Il concetto di AMORE - Sören Kierkegaard

Nas 'Obras do Amor', Kierkegaard insistentemente profere que o amor supõe uma "prática" que convoca cada indivíduo para a responsabilidade diante do outro e do mundo. Nesse sentido, o "conceito" do amor pode até permanecer oculto, pois o "amor" somente pode se manifestar mediante as obras.
No dizer poético, por sua vez, encontramos sempre uma possibilidade de aproximação, ou seja, de elevação para o infinito enquanto desejo de plenitude. Numa perspectiva psicológica é precisamente o que permite a disparidade na relação entre pares, ou seja, a quebra da paridade como forma de relação dual (jogo de disputas: ou eu, ou ele).
A disparidade é possível quando no campo simbólio de nossos afetos há um referente terceiro, o Outrem, que passa a ser presentificado no outro. Aqui, o esteta, o ético e o religioso podem ser "um" no amor, pois segundo Kierkegaard, "Faz parte de uma relação de amor a triplicidade: o amante, o amado, o amor; mas o amor é Deus." (p.146)

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Pensar Direitos Humanos: "Democracia e Sociedade de Consumo"

Autonomia, o que é?
Democracia, “o governo dos outros”; qual o significado que subjaz nesta afirmação? Qual a relação que aí se estabelece com a ideia de vontades governadas, indivíduos sujeitados? Em que medida o campo simbólico dos sujeitos é preenchido pela necessidade do consumo?
Neste vídeo, uma oportunidade de pensar os pressupostos do filósofo sobre estas questões que envolvem a governança e a produção de subjetividades.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Pensar Direitos Humanos: "Democracia de Mínimos e a Negação dos Direitos...

Dentro do projeto Pensar Direitos Humanos, o filósofo e professor Castor Bartolomé Ruiz, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, fala sobre o tema "Democracia de Mínimos e a Negação dos Direitos Fundamentais".
Aqui uma excelente oportunidade de pensar nas questões que envolvem o significado da democracia. Conforme Ruiz, a democracia enquanto "auto-governo coletivo do comum" não se exerce nas sociedades modernas pelo fato de que a governança busca apenas o interesse próprio. Segundo Ruiz, "vivemos em uma sociedade que ao invés da colaboração do 'comum', (comunidade) temos a concorrência do 'próprio', (indivíduo) ou seja, mediante a desconfiança do outro, o que interessa é saber como é possível se utilizar da relação com esse outro para o próprio benefício."
Vale conferir:

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Natalia Romera - Aquarela TOQUINHO

LIBRAS - Língua brasileira de sinais.
Como qualquer outra língua, a Libras possui uma estrutura própria e complexa. Diferente das línguas orais que se utilizam da modalidade oral-auditiva é uma língua visual-espacial.
A linguagem, sabemos, é tudo o que envolve a significação enquanto forma de comunicação e expressão (música, pintura, dança, teatro).
Mimesis do grego significa imitação, a expressão do pensamento por meio de gestos. Aqui é possível perceber que significante e significado fazem (num sentido metafórico) uníssono, quero dizer, se mostram quase simultaneamente. O dizer se dá no campo visual-espacial e expressa, por meio de gestos, as ideias tanto implícitas quanto explícitas.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Difícil



Desaparecer a letra para desvelar o sentido?


“Por que tu escreves tão difícil?”
... não escrevo difícil,

meus pensamentos, ao contrário...

É que todo o dizer é difícil,
sobretudo quando as entrelinhas são preservadas...


......................

Contraponto:

“É preciso aprender que se tem inicialmente que soletrar cada obra de arte, depois aprender a ler e só depois começa-se a falar.” (Gadamer, p. 73 - A atualidade do Belo)

“imago animi sermo est” (Sêneca)
     A palavra é a imagem da alma.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Nostalgia

A outra face de mim quer o gozo nostálgico,
desejo,
de um tempo vivido, 
imaginado e esquecido, 
volatilizado
desejo.
Indicação constante das alegrias supremas, 
aparentemente plenas,
o traço.
Nas dores indizíveis, 
necessárias perdas, 
o campo:
desejo.
Horizonte agora é recompensa, 
o ganho:
desejo,
alhures endereçado...
.........
“O horizonte, a esfera do que é constante e envolve o homem, não é nenhuma parede que o cerca. Ao contrário, o horizonte aponta como tal para o que não foi fixado, para o que vem-a-ser e para o que pode vir a ser, para o possível.”  (HEIDEGGER, p.446- Nietzsche)

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Diferente de descuido ou displicência: Paciência.


Encarar as escolhas mais difíceis requer certa calmaria,
paciência.
Diante do futuro, sempre incerto,
paciência é presença de espírito

e esforço,
também.
....


Por descuido ou displicência:
[...] É que pra Bia sonhadora
O mundo era azul por beleza
Tudo o que acontece se acontece era pra ser
Com certeza
É que pra Bia sonhadora o mundo era um balão
Que voava num universo caipira,
Nas festas de São João, que deus dá todo mês.
(Oswaldo Montenegro)

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

As cores do édipo contemporâneo: mal-estar na subjetivação - Jean-Pierre Lebrun

Filosofia e psicanálise se unem na busca pela reflexão sobre os processos constitutivos das subjetividades ao longo do processo histórico. Extremamente instigantes, os pressupostos de Lebrun se desvelam pertinentes na medida em que apontam para algumas das rupturas ligadas ao campo simbólico e que refletem o perfil dos sujeitos histórico-sociais da atualidade. Eis aí uma excelente oportunidade de re-pensar estas questões sob o ponto de vista da psicanálise, indissociável, acredito, ao olhar da filosofia.

Jean-Pierre Lebrun
Debatedores: Nanette Zmeri Frej, Mario Fleig.
Promoção Programa de Pós-graduação em Filosofia -  Curso de Graduação em Filosofia.
Coordenação Profs. Mário Fleig, Inácio Helfer, Celso Candido.
Realizado em 15.05.2007 Sala Conecta UNISINOS

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

A Tragédia grega: entre a hermenêutica e a psicanálise.


Colóquio: A Tragédia grega: entre a hermenêutica e a psicanálise. 
Filosofia Unisinos – (novembro/2008)
Prof. Dr. Luiz Rohden e Prof. Dr. Mário Fleig.

Condição: “Quem não ouve tem de sentir”   
Na tragédia grega o significante opera sem ser nomeado, ou seja, do ato de instruir e dar prazer resulta a compaixão e o temor. Resumidamente podemos pensar que na tragédia grega o que se passa com o expectador é que "por um viés indireto" ocorre uma espécie de empatia, ou seja, a possibilidade de colocar-se no lugar do outro. Como um movimento circular de abertura do sujeito, inicialmente significa um sair de si, enquanto auto-esquecimento, para retornar a si como uma fusão de horizontes. Aqui uma possibilidade de autoconhecimento. Enquanto condição humana, apreender o real entre a dor e a compaixão significa o aprendizado pelo sentir, um novo olhar que movimenta o sujeito para a dimensão da responsabilidade, ou seja, ações reguladas por escolhas mais éticas e menos perversas. Como pensar estas questões em nossos dias é também a proposta desta conferência que tive o privilégio de presenciar. Sendo assim, minha proposta hoje é partilhar destas significativas reflexões que sem dúvida tem muito a nos dizer sobre alguns dos impasses do nosso tempo.



Prof. Dr. Luiz Rohden e Prof. Dr. Mário Fleig.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Conferência Álvaro Valls

Permito-me neste meu espaço partilhar deste recorte da conferência do professor Álvaro Valls na segunda Semana Acadêmica de Filosofia da UFPel.
Estimado intelectual, amigo afetuoso cujas aulas costumo sempre afirmar: “enTUsiasmadas”, provocam e instigam a todos os que gostam da boa Filosofia.
Sendo assim, somente para provocar, deixo apenas um fragmento do que são as aulas do Professor Alvaro que em sua fina ironia sabe bem instigar a reflexão a respeito das questões sérias.  

domingo, 2 de outubro de 2011

O desconfiado, o amoroso e o saber

A atitude de, por desconfiança, não crer em absolutamente nada (o que é bem diferente do saber a respeito do equilíbrio das possibilidades opostas entre si) ou de crer em tudo por amor, não é portanto um conhecimento e nem é, de modo algum, conclusão tirada de um conhecimento: porém, é uma escolha que surge justamente quando o saber estabeleceu o equilíbrio das possibilidades contrárias; e nessa escolha, que por certo tem a forma de um juízo sobre os outros, aquele que julga acaba por se revelar. [...] Nós humanos temos um temor natural de cometer erros ao formarmos uma opinião boa demais sobre uma pessoa. O engano que consiste em formar uma opinião ruim demais sobre outra pessoa, por outro lado, quiçá não se tema, pelo menos na mesma proporção que o primeiro. (KIERKEGAARD, As Obras do Amor)

sábado, 1 de outubro de 2011

"Instantes plenos de eternidade"

A afirmação “Instantes plenos de eternidade” pode bem significar o niilismo. Mas pode ser também no sentido como afirmava o filósofo dinamarquês: aqueles instantes em que as ações não estão dissociadas das significações do sujeito existente. Segundo ele, as escolhas são possíveis “aqui e agora”, ou seja, é no instante que escolhemos, mas as "obras" são da ordem dos afetos. Estes  instantes, átomos do nosso tempo finito, são agora os "instantes plenos de eternidade".   Eis o pathos no sentido grego: paixão enquanto mobilidade e imperfeição.

Angústia e amor são "virtudes práticas" que demandam coragem.” (Luiz Felipe Pondé)

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Pathos

Acredito no pressuposto de que pathos  somente existe na imperfeição que nos é própria. Nesse sentido, a ironia consiste precisamente no fato de que a nossa possibilidade amorosa  ampara-se sempre numa certa harmonia entre pathos  e  cômico. Aqui, minha concordância com Sören, quando da sua afirmação:
A existência mesma, o existir, é esforço, e é tão patética quanto é cômica; patética porque o esforço é infinito, i.e, dirigido ao infinito, é um processo de infinitizar, que é o mais elevado pathos; cômica porque o esforço é uma auto-contradição. (Pós-Escrito, Kierkegaard)

terça-feira, 27 de setembro de 2011

PACIÊNCIA - Chronos ou Kairos?

Necessariamente estamos todos submetidos ao aspecto quantitativo do tempo (Chronos) que em grego significa a duração de um movimento, o nosso tempo medido, cronológico. Os gregos da Antiguidade expressavam o tempo com duas palavras: Chronos e Kairos. A partir da modernidade, no entanto, impregnados pelo espírito mecanicista esquecemos de que Kairos significa o tempo da oportunidade, o tempo em potencial, eterno. Nessa pesrpectiva, esta melodia composta por Lenine e Dudu Falcão é uma excelente possibilidade de pensar sobre estas questões:
  


Enquanto condição da existência o tempo parece mesmo exigir demasiada pressa e afobados já não pensamos, nos tornamos impacientes e egoístas; aliás, é preciso estar atento, pois todo individualismo provoca uma espécie de cegueira. E ainda insistimos em acreditar que essa aparente “normalidade” é indissociável ao humano. Perdemos com essa irreflexão o significado do instante em que algo “especial” pode acontecer. No entanto, como nos diz a melodia, é preciso “um pouco mais de paciência”, pois parece que ninguém quer mesmo saber; pensar? nem pensar. Demasiada é a pressa. E assim contamos os dias que se tornam medíocres e simplesmente passamos pela vida com o sabor amargo do desencantamento do mundo. Sem o outro não há a possibilidade de acontecer algo que realmente importa. Tornamo-nos Sísifos a experimentar o absurdo da existência dia após dia. Mas há algo que clama insistentemente em nossa interioridade. Esse clamor é kairos, o tempo do possível, cujo murmúrio emerge de nossos próprios abismos como um sopro qualitativo. Aqui a qualidade significa que não basta saber sobre a incomensurável fluidez do tempo que sempre e inevitavelmente nos escapa. É preciso antes compreender que a vida é preciosa demais para evitar instantes que podem se tornar plenos de sentido. É na quietude que descobrimos que sem o acolhimento para com o outro não há a possibilidade de tais instantes, pois nos tornamos como as solitárias e indivisíveis mônadas. Diante da efemeridade da existência reconhecemos agora que junto aos dias simplesmente quantitativos podemos também “praticar” instantes que se eternizam. É a consciência da facticidade humana que agora emerge em nós como um sussurro e faz brotar o instante indeterminado: o instante em que as coisas que realmente importam acontecem. Aqui a “oportunidade” está justamente no modo como escolhemos. Eis aí uma possibilidade de sentido, um novo olhar em que Chronos (tempo) pode ser também Kairos (eternidade).

sábado, 24 de setembro de 2011

L’ironie est l’antidote

[...] L’ironie nous immunise contre La déception ; elle est l’antidote des fausses tragédies, la conscience que nulle valeur n’épuise toutes les valeurs ; elle lutte contre l’inertie des sentiments qui s’attardent, deviennent formule ; elle rapelle à l’ordre les douleurs qui s’éternisent et prétendent être totales, c’est-à-dire désespérées; elle est donc, en même temps qu’une grande consolatrice, un principe de mesure et d’équilibre... [...] mortelle au pédantisme maniaque et à toutes les unilatéralités de l’esprit, elle forge des âmes harmonieuses, divisées, multilatérales qui veulent pour centre non plus un vice, mais une valeur vraiment essentielle. [...] l’ironie nous demandera résignation, patience et três commune bonne humeur. C’est que nous ne sommes pas des anges. Il y a dans chaque instinct, dans chaque passion de quoi nous briser le coeur... (JANKÉLÉVITCH, p.164)

domingo, 11 de setembro de 2011

Medo

Não tenho medo do medo.

Medo é o que sinto diante de um fato já vivido, mas a angústia, ao contrário, grita aqui dentro.
É que as tuas dores impronunciáveis são tão idênticas as minhas...
Não fosse a ausência mesma,
condição: aceitação e reconhecimento dela,
a humana falta...
É que esse meu vazio que não dou conta de pronunciar nos faz agora idênticos, quiçá semelhantes...
Estou incomensuravelmente tão próxima ao indizível mesmo que há em ti que já não temo o medo que é próprio.
Medo é fato já conhecido, experienciado.
Mas a angústia, ao contrário, insistentemente grita aqui dentro...
Como que diante de um precipício quero saltar, mas não apreendo a fundura... vertigem é o que sentimos, afirmava Kerkegaard. Mas há ainda o desejo.
Desejo é paixão de futuro, sempre alhures, necessariamente contingente. Nela, contingência, encontro o horizonte que me faz livre. Desejo agora, senão os instantes contados em que me lanço para os braços do meu possível. Sem o outro, entretanto, você mesmo que me olha, não sou...

nada.


Contudo,
[...] “é preciso recordar a cada instante que a diferença é um disfarce.” (Kierkegaard, p.111)

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

terça-feira, 30 de agosto de 2011

O Cômico


É preciso duvidar de tudo, já afirmava Descartes em sua dúvida metódica. A partir daí eis o significado do real, pois todo o saber (inclusive sobre o sujeito) pressupõe como condição um método, ou seja, também no sujeito a soma das partes é igual ao todo.

Muitos ainda hoje, precisamente porque julgam que sabem,
o outro, eles julgam...


lamento,
mas preciso antes,
brincar...

Como diria Kierkegaard, todo o desconfiado é na verdade um cômico, pois esconde o si mesmo por trás de uma metodológica e pretensiosa certeza. Enquanto pura objetividade se sabe, quero dizer, apreender o que na “verdade" se passa é saber tudo sobre o outro, afinal, quando se é desconfiado é que de fato se sabe.

Sem a mesma pretensão, uma vez mais
o meu riso...

Renunciar a maldosa consciência, isso sim parece loucura, afinal, quando para o sujeito o real é tão somente racional,
eis o cômico.


..................


L’ironie logique fait saillir l’absurdité latente, ainsi l’ironie éthique fait éclater les scandales invisibles, car le scandale est l’absurdité pour un libre vouloir comme l’impensable absurdité est le scandale pour la raison. L’ironie morale laisse la mauvaise conscience s’enferrer, développer jusqu’à l’absurde les conséquences de ses prétextes, pour qu’elle demande grâce. Plus les prétextes sont faibles, plus la conscience honteuse se montre follement logique dans ses déductions et largement vulnérable à l’ironie : le scandale démasqué meurt d’être soi-même. (JANKÉLÉVITCH, L’ironie, p.101 e 102)

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Melancolia


Hoje, por você,
uma certa melancolia.
Em teus gestos, olhar e palavras há
agitação e rancor,
desconfiança
com você, no mundo em você,
desespero...
E já não há nada que eu possa dizer ou fazer,
silêncio...
Silêncio pode ser melancolia,

pode ser também quietude e serenidade...
mas pode ainda que seja amor.


...

"Se não podes falar àqueles que estão envinagrados, serve-os em silêncio e na humildade, sem jamais desesperar." (DOSTOIÉVSKI, Irmãos Karamázovi: Extratos conversações do "Stáriets" Zósima, p.235).

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

A responsabilidade indissociável a todo o dizer.


Sempre que reflito sobre determinado tema sou logo tomada pela inquietação de não apenas comunicar, mas a partir disso produzir questões que suscitem a criticidade por parte do leitor. Frustração seria se em tais reflexões obtivesse apenas uma espécie de consenso, ou seja, a imediata concordância para os pressupostos abordados.
Se toda a compreensão somente é possível diante de “pré-supostos”, ou seja, conhecimentos previamente estabelecidos, então a interpretação deve partir sempre de um posicionamento que não o meramente passivo. Contudo, não significa afirmar que um posicionamento possa ser considerado ativo pelo simples fato de que são validados por determinada maioria. Sob este aspecto podemos perceber que, de um modo amplo, determinadas programações televisivas ainda exercem essa função, ou seja, parecem não provocar contrapontos reflexivos senão idênticos aos do senso comum.
Estou ciente de que sempre haverá, em algum lugar, capacidades compreensivas maiores e melhores do que as minhas; contudo, não significa que cessem as minhas inquietações no sentido de questionar sempre. Mas o que de fato me inquieta é que se no “dizer” pressupõe-se um saber, então na medida em que esse dizer aprova ou refuta determinados pontos de vista, ele autoriza-se no sentido de exercer influências. É precisamente nesse sentido que ao partilhar determinados pressupostos não posso me liberar da responsabilidade diante desse meu leitor. Diante do meu próprio inacabamento e da consciência de que sou apenas travessia, preciso me isentar da pretensão de formular opiniões, sem antes buscar “aclarar” conceitos. Esclarecer conceitos significa aqui questioná-los, obviamente, a partir do meu contexto interpretativo sem deixar de considerar suas “re-significações” decorrentes do processo histórico.
Minha liberdade se manifesta na medida em que busco apreender novas possibilidades interpretativas, mas à medida que compreendo cresce a minha responsabilidade, pois necessito agora também comunicar. É precisamente nesse sentido que acredito em um processo compreensivo que se diga emancipatório, isto é, capaz de abrir mão da irreflexão ou do mero assentimento, para ceder lugar a uma análise crítica e questionadora a partir de si mesmo enquanto intérprete. Além da sujeição, acredito, somos capazes de ceder lugar ao simplesmente dado, a simples passividade para nos tornarmos sujeitos questionadores, críticos e conseqüentemente ativos no mundo. Essa consciência é em mim mesma a movente, pois sempre e a cada novo dia, sou movida pelo crescente desejo de comunicar; preciso dizer, por isso escrevo.

sábado, 20 de agosto de 2011

Te tornas eternamente responsável por aquele que cativas.


Recentemente lendo uma colunista conterrânea, cujas crônicas aprecio, o recorte reflexivo proposto era precisamente este: “És eternamente responsável por aquele que cativas”. Como um questionar para esta afirmação, ela traz como contra-argumento uma possibilidade própria de escolha: “me concedo o direito de não me sentir responsável por aquele que cativo”. Acrescenta ainda, o que justifica a sua autenticidade, que o sentimento diante desse outro por ela “cativado” é de gratidão e envaidecimento, “mas responsável é um tantinho demais.”
Esclareço desde logo, que o objetivo não é aqui criticar a nossa cronista, ao contrário, a proposta é trazer, como contraponto, um outro viés reflexivo. Compreendo e respeito este “ponto de vista”, sobretudo por entender a dimensão que tem hoje o significado da palavra liberdade para os indivíduos. Também pelo fato de que estou convencida de que toda a compreensão somente é possível a partir dos “pré-conceitos”, quero dizer, algo presente em nossas crenças (aquilo que aceitamos como verdade). Nesse sentido o que nos conduz a interpretação não está dissociado do contexto mesmo em que estamos inseridos enquanto intérpretes.
Meus leitores podem estar questionando: afinal, onde ela quer chegar com estas afirmações?
Sabemos que Antoine de Saint-Exupéry, em seu livro “O Pequeno Príncipe”, fez-se conhecido sobretudo por esta reflexão que diz: “Tu deviens responsable pour toujours de ce que tu as apprivoisé”. Este livro, que somente teve a sua publicação na frança em 1945, em virtude do exílio de Exupéry nos EUA, oferece, entre tantos sentidos possíveis, a possibilidade de mostrar uma profunda mudança de valores. O autor parece provocar o seu leitor, pois sugere o quanto podem ser equivocadas as nossas interpretações e julgamentos diante das coisas, das pessoas e do mundo. Sob este aspecto, o autor nos faz pensar em que medida estes julgamentos mesmos podem nos conduzir a solidão.
Num tempo em que já não se fala de valores como o amor, senão de um modo pragmatista, mas que por sua vez se prega a ideia do “politicamente correto”, contraditoriamente essa afirmação de Exupéry soa aos indivíduos, no mínimo, sujeita a contestações.
Entretanto quando reflito na esteira de Lévinas, por exemplo, pensar este outro que me olha e que por sua vez me interpela, ele o faz independente do meu querer. Não tenho domínio e controle, pois ele me chega, sou abordada por ele. Vemos aqui a dimensão da liberdade de que nos falava Sartre: “estamos condenados a ser livres”, livres para escolher.
No entanto, sair do “senso comum” significa sobretudo refletir com rigor sobre determinados recortes nas falas dos sujeitos. Sob estes aspectos, se tirarmos a dimensão da responsabilidade que não está dissociada da liberdade, toda e qualquer possibilidade de liberdade torna-se solipsista, ou seja, como uma mônada fechada em si mesma. Para escaparmos a esse senso comum, é preciso sobretudo um retorno sobre si mesmo, ou seja, um olhar que consegue ver para além do meramente eu mesmo. Com esse olhar, é possível, vejam, (diante da contingência dos sujeitos não posso afirmar que aconteça de modo necessário) mas é possível que suscite a consciência da incomensurabilidade que há em nós mesmos. Esse indizível, sempre e a cada vez suscitado por nosso desejo de vida, é o que nos lança alhures, nos move em direção ao futuro rumo a realização de nossos projetos.
Neste ponto de minhas argumentações pode parecer contraditório, pois falar de sujeitos requer a compreensão de que há em cada indivíduo as suas particularidades e por isso mesmo ele é e será sempre singular. Contudo, o paradoxo da nossa condição de sujeitos é que em cada singularidade há a mesma dimensão incomensurável, quero dizer, sob este aspecto, de uma maneira ou de outra, é o que nos faz idênticos. Este rasgo em nós, essa falta mesma que nos lança rumo aos nossos projetos, aspirações e sonhos, já não nos torna diferentes desse outro que nos interpela e que cativamos. Não. Sob este aspecto somos iguais e não há o que me torne melhor ou pior do que esse outro que me interpela.

Eis-me aí, diante da minha liberdade de escolher, tornar-me ou não responsável. Somos livres e, portanto, somos o resultado de nossas escolhas.

Sendo assim, consciente da própria facticidade, minha expectativa é de que tenha conseguido provocar um contraponto reflexivo. Proponho então que pensemos, talvez além da frase que deu origem a estas questões, também outra presente no mesmo livro, que diz: “Mais les yeux sont aveugles. Il faut chercher avec le coeur.” Ou seja, Mas os olhos são cegos. É preciso procurar com o coração.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

"A moral é da ordem do afeto". Luiz Felipe Pondé

Os pressupostos que abordaremos a seguir podem ser entendidos, sobretudo como uma proposta ética para a existência; quiçá uma alternativa possível para a constituição de novos sujeitos, pois em um sentido amplo a moralidade não abre mão da obscuridade pretensiosa e totalitária, quero dizer, de uma objetividade que ao fim se torna petrificada. Vivemos em uma sociedade que prega o “politicamente correto”, mas contraditoriamente, produz uma massa acéfala, submete. Talvez aqui uma alternativa da ordem dos afetos, esses que somente podem emergir de nossos próprios abismos, possam se tornar a luz que brilha no escuro.
Enquanto pesquisadora do filósofo dinamarquês, minha proposta hoje é partilhar com meus leitores deste artigo de Luiz Felipe Pondé:


Nunca ter amado é uma forma terrível de ignorância

Título original: Meu irmão Kierkegaard

por Luiz Felipe Pondé para Folha

Quando você estiver lendo esta coluna, estarei em Copenhague, Dinamarca, terra do filósofo Soren Kierkegaard (1813-1855), pai do existencialismo. Ao falarmos em existencialismo, pensamos em gente como Jean-Paul Sartre, Simone de Beauvoir, Albert Camus, tomando vinho em Paris, dizendo que a vida não tem sentido, fumando cigarros Gitanes.

O ancestral é Pascal, francês do século 17, para quem a alma vive numa luta entre o "ennui" (angústia, tédio) e o "divertissement" (divertimento, distração, este, um termo kierkegaardiano).

O filósofo dinamarquês afirma que nós somos "feitos de angústia" devido ao nada que nos constitui e à liberdade infinita que nos assusta.

A ideia é que a existência precede a essência, ou seja, tudo o que constitui nossa vida em termos de significado (a essência) é precedido pelo fato que existimos sem nenhum sentido a priori.

Como as pedras, existimos apenas. A diferença é que vivemos essa falta de sentido como "condenação à liberdade", justamente por sabermos que somos um nada que fala. A liberdade está enraizada tanto na indiferença da pedra, que nos banha a todos, quanto no infinito do nosso espírito diante de um Deus que não precisa de nós.

O filósofo alemão Kant (século 18) se encantava com o fato da existência de duas leis. A primeira, da mecânica newtoniana, por manter os corpos celestes em ordem no universo, e a segunda, a lei moral (para Kant, a moral é passível de ser justificada pela razão), por manter a ordem entre os seres humanos.

Eu, que sou uma alma mais sombria e mais cética, me encanto mais com outras duas "leis": o nada que nos constitui (na tradição do filósofo dinamarquês) e o amor de que somos capazes.

Somos um nada que ama.

A filosofia da existência é uma educação pela angústia. Uma vez que paramos de mentir sobre nosso vazio e encontramos nossa "verdade", ainda que dolorosa, nos abrimos para uma existência autêntica.

Deste "solo da existência" (o nada), tal como afirma o dinamarquês em seu livro "A Repetição", é possível brotar o verdadeiro amor, algo diferente da mera banalidade.

É conhecida sua teoria dos três estágios como modos de enfrentamento desta experiência do nada. O primeiro, o estético, é quando fugimos do nada buscando sensações de prazer. Fracassamos. O segundo, o ético, quando fugimos nos alienando na certeza de uma vida "correta" (pura hipocrisia). Fracassamos. O terceiro, o religioso, quando "saltamos na fé", sem garantias de salvação. Mas existe também o "abismo do amor".

Sua filosofia do amor é menos conhecida do que sua filosofia da angústia e do desespero, mas nem por isso é menos contundente.

Seu livro "As Obras do Amor, Algumas Considerações Cristãs em Forma de Discursos" (ed. Vozes), traduzido pelo querido colega Álvaro Valls, maior especialista no filósofo dinamarquês no Brasil, é um dos livros mais belos que conheço.

A ideia que abre o livro é que o amor "só se conhece pelos frutos". Vê-se assim o caráter misterioso do amor, seguido de sua "visibilidade" apenas prática.

Angústia e amor são "virtudes práticas" que demandam coragem.

Kierkegaard desconfia profundamente das pessoas que são dadas à felicidade fácil porque, para ele, toda forma de autoconhecimento começa com um profundo entristecimento consigo mesmo.

Numa tradição que reúne Freud, Nietzsche e Dostoiévski (e que se afasta da banalidade contemporânea que busca a felicidade como "lei da alma"), o dinamarquês acredita que o amor pela vida deita raízes na dor e na tristeza, afetos que marcam o encontro consigo mesmo.

Deixo com você, caro leitor, uma de suas pérolas:

"Não, o amor sabe tanto quanto qualquer um, ciente de tudo aquilo que a desconfiança sabe, mas sem ser desconfiado; ele sabe tudo o que a experiência sabe, mas ele sabe ao mesmo tempo que o que chamamos de experiência é propriamente aquela mistura de desconfiança e amor... Apenas os espíritos muito confusos e com pouca experiência acham que podem julgar outra pessoa graças ao saber."

Infelizes os que nunca amaram. Nunca ter amado é uma forma terrível de ignorância.

> Espécie humana sumirá sem deixar 'fóssil' do seu fracasso afetivo.
abril de 2011


sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Velha Infancia em LIBRAS


Velha Infancia - Tribalistas (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown)
Performance em Libras - Naiane Olah (@NaiaNeOlaH)
Vídeo - Lívia Vilas Boas
Realização - Fundação de Rotarianos de São Paulo, Escola para Crianças Surdas Rio Branco e Colégio Rio Branco

Categoria:
Música
Palavras-chave:
libras língua de sinais música tribalistas velha infância
Licença:
Licença padrão do YouTube

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

A voz, o dizer e a presença


Presença bem pode ser o ser, mas é possível que seja ainda ausência.
A voz que subjaz ao dizer é ainda murmúrio. Como o suspirar que é tanto clamor quanto lamento, a voz é também sopro, aspiração e renúncia. Todo o dizer se mostra, mas naquilo que se oculta há ainda a voz.
Suspiro é, pois, como a voz: presença lançada alhures, pranto sem lágrimas, sorriso sem riso, é inquietude... A voz, assim como o suspiro, é o que sempre me escapa.
Ser para a vida, ser para a morte:
Cotidiano esquecimento é fuga, pois a ausência de si é também medo.
Presença, por sua vez, requer coragem, a entusiasmada paixão do enfrentamento é tornar-se, sobretudo si mesmo. No entanto, em tempo de presenças iguais em que a marcha segue irrefletida, a ausência torna-se presença enquanto a consciência do seu contrário sugere uma espécie de loucura.
Ausência pode ser carência apenas, mas pode ser ainda a consciência de que a falta (essa que mostrando se oculta) é também presença. Liberdade é, pois, poder escolher e tornar-se si mesmo é sobretudo responsabilizar-se.


Angústia é cura.

...
Um ensaio? Não. Esboço apenas... fragmentos de uma despretensiosa re-leitura hermenêutica em Heidegger...
...

Referências:
HEIDEGGER, Martin, Ser e Tempo; tradução revisada e apresentação Márcia Sá Calvalcanti Schuback; Petrópolis: Vozes, 2006.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Metamorfose de Narciso


Recentemente dialogando com um dependente químico em tratamento, escutei que em determinadas “palestras motivacionais” que visam a reabilitação destes sujeitos, há um discurso que, não sem assombro, tenho escutado com certa frequência. A ausência de espanto se dá pelo fato de que já é possível encontrá-los (argumentos mesmos) nos refrões da nossa “música popular”, que a esse exemplo diz:


Primeiro eu, segundo eu, terceiro eu... agora é assim
Primeiro eu, segundo eu, terceiro eu... vou cuidar de mim
Primeiro eu, segundo eu, terceiro eu... agora é assim
Primeiro eu, segundo eu, terceiro eu... vou cuidar de mim

A "vantagem aparente" é que essa persuasão automatizada parece exercer dupla função: além de "motivar" e colocar o sujeito “novamente na certeza” há ainda a possibilidade de apreender uma nova conjugação verbal, pois diz e faz dizer:
1ª pessoa: EU
2ª pessoa: EU
3ª pessoa: EU
Aqui o que se passa é que o “tu” e o “você” são logo excluídos. O que dizer então do deslembrado OUTREM?
Há neste dizer, me parece, o pressuposto de que se exerce uma “reflexão sobre si”, quando a ambigüidade consiste precisamente no fato de que é na “irreflexão sobre si” que o egoísmo prevalece.
Ora, se na reconstrução de novos significados o sujeito não encontra significantes que façam laço com o outrem: campo dos afetos, como pressupor que ali se instaure a possibilidade de relações senão exclusivamente duais?

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Diferente de autoajuda


Filosofia é crítica conscienciosa, rigorosa hermenêutica que envolve não somente textos escritos, mas também tudo que há no processo interpretativo. Filosofar é o questionar constante, um inquietante instigar a si mesmo a partir de fundamentos. Implica necessariamente pensar, não um pensar apenas, mas enquanto tarefa é a reflexão sobre fundamentos teóricos, indissociáveis para esta análise, sobretudo o contexto histórico, social e cultural em que se fundam. Daí uma razão para jamais criticar este ou aquele teórico. Como afirmava Kierkegaard, é o mesmo que comprar o livro, não ler página, e guardá-lo na estante como um troféu. Pensar é como ruminar, é retorno sobre si mesmo, requer, pois, introspecção e prospecção, avanço e recuo, senso crítico, consciência de si, humildade. Diferente da autoajuda, a filosofia parte da dúvida e da incerteza; na medida em que questiona, as respostas não aparecem dispostas como nas bulas de medicamentos, quero dizer, assim como para a vida não há receitas acabadas, pois somos travessia, também a filosofia não se presta às conferências motivacionais. Filosofar é, pois, como a ponte: rompimento e inquietude, clamor e murmúrio, fuga de si e medo, mas é também curiosidade, coragem, reconciliação e reencontro.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Frágil


Com frequência busco exercer a experiência de não apenas olhar para as coisas, mas sim de uma maneira atenta e conscienciosa ver um pouco além isso o que aparentemente se mostra.
Uma excelente oportunidade de praticar esse exercício e, talvez, uma possibilidade de cura também nossa, seria uma vez apenas visitar a emergência de um hospital. Estive recentemente visitando uma pessoa próxima em uma dessas alas de emergência e lembrei, ao entrar, de desencobrir os olhos meramente físicos, quero dizer, esses que conseguem ver somente a aparência daquilo que ainda não é diante disso que se mostra como real.
Então, com os olhos da alma, ou se preferir com uma pequena dose de empatia, experimentei agora olhar uma outra vez.
Todos aqueles que lá permanecem, estão nus. E essa nudez que vi não é a física, aquela dos aventais entreabertos que nos colocam nos hospitais, foi algo outro o que vi. Sem muito espanto, pois algumas questões “humanas” se apresentam tão “desumanas” que inevitavelmente oscilamos entre a tragédia e a comédia. A ironia consiste justamente no fato de que isso o que vi não está distante de cada um de nós; ausente talvez, pelo irrefletido em nós mesmos. Por outro lado, a tragicidade maior, me parece, é que continuamos apenas olhando, simplesmente nos recusamos ver, pois de algum modo sabemos isso que somente temendo e tremendo encontramos em nossa interioridade mesma. Qual foi minha percepção?
Sem exceção, todos estão desnudos de qualquer arrogância, libertos da presunção, despidos de qualquer orgulho, isentos de toda vaidade e empáfia. Estão nus como jamais estiveram e, no entanto, essa fragilidade mesma, vejam, é o que de fato verdadeiramente somos. Não sou, pois, esse olhar convencido que se reflete no espelho, a vaidade dos meus belos olhos verdes, castanhos ou negros... Não sou a ilusória ideia que tenho sobre as coisas tantas que faço, os objetos que adquiro e as quinquilharias que me parecem tão caras; ou ainda, o bem sucedido empresário que me tornei, talvez aquele influente político, o grande intelectual. Tudo isso é agora prosaico, tão sem importância, desnecessário. Assim despidos nada mais importa, senão a vida mesma. Todos ali submetidos estão sós, entregues a impotência própria, equilibrados nessa linha frágil e tênue que é a vida. A grande ironia é que, sem exceção, não estamos imunes.
Felizmente essa nudez que agora olho mais atentamente bem pode se tornar um amoroso antídoto para tudo o que ainda não é, pois diante do que sou “íntima, honesta e verdadeiramente” apenas o acolhimento basta. Acolhimento que no sentido mais próprio significa a possibilidade de Amor enquanto prática. O olhar meramente físico não basta. Enquanto olhamos e não vemos além do que está aí posto como real, não somos, estamos ainda cegos.
Acolhimento é retorno a nós mesmos, consciência também de nós, por nós próprios junto a esse outro que nos olha e demanda a acolhida mesma que necessitamos.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Inversão

Inversão

Há aqueles que nada praticam, senão
o nervosismo próprio a alegar,
Enquanto o seu bocado outros fazem,
criticam, pois acreditam: "não posso me responsabilizar."

“In quo alterum iudicas te ipsum condemnas” (Rm 2,1). Tu te condenas a si próprio, naquilo que julgas o outro.

Máscaras

Máscaras

As tentativas sempre renovadas
De remover as máscaras alheias
O temor nos comprovam, a mancheias,
De termos nossas próprias arrancadas.
(Professor Nedel, 2009)


"O nosso mundo civilizado não passa de uma grande mascarada" (Shopenhauer, 1964).
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Complemento ainda, não sem a mesma ironia, com a seguinte citação:

"Nós deveríamos prestar atenção naquilo que a linguagem mesma nos expõe." (Heidegger)
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Referências:
NEDEL. José, A Curvatura da Razão: poemas, Edição do Autor, Porto Alegre, RS, 2009)


quarta-feira, 13 de julho de 2011

Für Elise: Ludwig van Beethoven



Sempre singular isso o que sentimos diante da sonoridade de uma melodia e os efeitos que ela pode nos proporcionar. Quão inatingível é a possibilidade de seu decifrar?
Experimente!
Feche os olhos, apenas sinta...
Conheça e desfrute do que ela proporciona e, uma vez apenas, tente decifrá-la...


A música parece mesmo como a compreendia Nietzsche:Dionisíaca, dissonância entre alegria e dor, prazer e desprazer...
Simultaneamente, sugere, atração e repulsa. Queremos ir além,plenitude...

Lugar outro que desejamos estar, permanecer, mas
assim como o gozo, sempre nos escapa.

Arrebatamento é também silêncio...

terça-feira, 12 de julho de 2011

Mario Quintana

“Se um poeta consegue expressar a sua infelicidade com toda a felicidade, como é que poderá ser infeliz?” (Mário Quintana)


... ao nosso querido e imortal poeta Mário Quintana...



A sabedoria é brincalhona, faz parecer tranquilo o que insistentemente nos acossa...


O Poeta diz sorrindo o que parece chorar.
Muito mais sobre o que é sério sugere, ao contrário, brincar.
Surpresa nossa, doce constatação:
encontrar em nós mesmos essa amorosa consolação.
(Gules/2011)

Isso mesmo que ele pensa a sério é também sua forma de ironizar.

sábado, 9 de julho de 2011

A la fois maître et victime

Felicidade é saber que não estou "necessariamente" feliz o tempo todo. E quando me perguntam se estou triste, simplesmente respondo: é que estou pensando...
No recolhimento a alegria mesma da solitude, a alegre tristeza de que é triste a alegria.


A la fois maître et victime de son faux mais passionnant destin, le joueur sourit de se voir ainsi à califourchon sur le mensonge et la vie, sur le secondaire et le primaire ; le coeur lui bat d’être du même coup metteur en scène ou spectateur désabusé d’un spetacle, et acteur passionné d’un drame !
[...] Et nous persistons à accorder à notre persone une promotion privilégiée, à faire en sa faveur une exception ; nous ne pouvons croire qu’elle soit un objet comme les outres. (Jankélévitch, p.57)
(Ao mesmo tempo mestre e vítima de seu falso, mas apaixonante destino o jogador sorri de ver-se assim a cavalo sobre a mentira e a vida, sobre o secundário e o primário; o coração bate de ser ao mesmo tempo diretor ou um espectador desiludido de um espetáculo, e ator apaixonado de um drama! [...] E persistimos em atribuir a nossa pessoa uma promoção privilegiada, a fazer em seu favor uma exceção; não podemos crer que seja objeto como os outros).

sexta-feira, 8 de julho de 2011

A ironia sobre si


Quando considero a brevidade da existência dentro do pequeno parêntese do tempo e reflito sobre tudo o que está além de mim e depois de mim, enxergo minha pequenez. Quando considero que um dia tombarei no silêncio de um túmulo, tragado pela vastidão da existência, compreendo minhas extensas limitações e, ao deparar com elas, deixo de ser deus e liberto-me para ser apenas um ser humano. Saio da condição de centro do universo para ser apenas um andante nas trajetórias que desconheço... (Augusto Cury - O Vendedor de Sonhos).

L’ironie sur soi: [...] l’absence des choses qui ne son plus et l’absence des choses qui ne sont pas encore ; [...] L’ironie nous présente la glace où notre conscience se mirera tout à son aise : ou, si l’on préfère, elle renvoie à l’oreille de l’homme l’écho qui répercute le son de sa propre voix. Et ce miroir n’est pas ‘le sinistre miroir où la mégère se regarde’, mais le lucide, le sage miroir de l’introspection et de la self-connaissance. (Jankélévitch, p.36)

(A ironia sobre si: [...] a ausência das coisas que não são mais e a ausência das coisas que ainda não são; [...] A ironia apresenta-nos o gelo onde a nossa consciência mirar-se-á toda à vontade: ou, se prefere, retorna à orelha do homem o eco que reflete o som da sua própria voz. E este espelho não é `o sinistro espelho onde a megera se olha', mas o lúcido, o sensato espelho da introspecção e do auto-conhecimento).

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Reticências...


[...] Uma pessoa se recolhe, recupera-se da multidão pretensiosa que fala tagarela (como é expansiva!) ... e aprende devagar a reconhecer as poucas coisas em que perduram o que de eterno se pode amar e a solidão de que se pode tomar parte em silêncio." (Cartas a um Jovem Poeta; Rilke, p. 53).

La réticence, c’est Le discours expirant, le passage de l’explicite au tacite. [...] les points de suspension qui étranglent nos phrases représentent en quelque sorte la cicatrice laissée par les mots disparus. Le silence est donc une absence tandis que la réticence – c’est-à-dire la 'figure de silence' – semblable en cela aux passes et soupirs du discours musical, es une interruption expressive, une espèce de valeur sonore. (Jankélévitch, p.89)

(A reserva é o discurso que expira, a passagem do explícito ao tácito. [...] os pontos de suspensão que estrangulam as nossas frases representam de certa forma as cicatrizes deixadas pelas palavras desaparecidas. O silêncio é, pois, uma ausência, enquanto a reserva - ou seja, “a figura de silêncio” - semelhante às passagens e suspiros do discurso musical, é uma expressiva interrupção, uma espécie de valor sonoro).

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Desejo inominável II


Desconhecer o verdadeiro lugar de onde falo é antes o que me parece mover, mesmo que eu ainda não saiba.
Isso que em mim parece permanente é do mesmo modo o que sempre e a cada vez mais me escapa. Já não sei dizer o que penso saber e o que digo não se deixa representar. Uma certa ausência em mim, uma falta, divisão que recuso suprimir, pois em certo sentido a amo.
Por isso, inevitavelmente continuo dizendo, buscando e persistindo nesse desconhecido que me ultrapassa e que sugere ser “outro lugar” o meu próprio impossível.


[...]L’ironie, c’est l’inquiétude et La vie inconfortable.” [...] L’ironie proteste contre le rationalisme statique et rend hommage à la temporalité de la vie. (...) en somme, sauve ce qui peut être sauvé. La sagesse commence au point précis où le cynisme de l’analyse ne nous gâte plus le plaisir ingénu de la synthèse.[...] l’ironiste fait faire par l’autre tout ce que l’autre peut faire de lui-même. (L'IRONIE, Jankélévitch).

terça-feira, 5 de julho de 2011

A possibilidade: aproximação


Intuir sobre o incomensurável que há em mim é sem dúvida o primeiro passo para a aproximação. Heráclito, em seu recolhimento próprio, soube bem apontar para o limite do Lógos. Em seu fragmento 45, que recebeu leitura e tradução de Heidegger, diz: “Ainda que tu percorras todo caminho, não poderás mais encontrar em teu curso os confins extremos da alma; tão vasto pousar/colheita/leitura (recolhimento) ela tem.
Em Heidegger encontramos uma poética explicitação da relação entre a consciência de si e a angústia sobre a realidade e a “verdade” do ser:


Compreender o ser quer dizer compreender o ‘fundamento’. Com-preender quer dizer aqui ‘ser compreendido no ser pelo ser’. Compreender significa a cada vez aqui mutação de humanidade a partir de sua relação essencial com o ser, mas primeiro que isto, a disponibilidade para esta mutação, mas antes a preparação desta disponibilidade, mas antes, a atenção para esta preparação e antes a incitação a uma tal preparação e antes um primeiro recolhimento no ser (GA 51,93).


A aproximação não está em outro lugar senão na temporalidade, isto é, em minhas próprias vivências, intimamente ligadas a linguagem e as limitações que tenho de enunciação sobre o que seja a “verdade”. Da cura, caminho que é único, porém sempre rasgado, dividido por uma diferença que interpela e atravessa meu ser, sigo agora somente em preparação. Sou travessia. Qual o antídoto? O futuro, esse desconhecido que, assim como a angústia, ainda é nada diante da “possibilidade”. Essa diferença que não dou conta e que me lança alhures é também o sopro mesmo que inspira, a fonte de apropriação e sentido. E eis que abandonada a certeza da certeza, essa que ainda é desespero, me lanço agora para os braços do possível.

L’ironie regarde ailleurs. (...) "Si nous voulons guérir le désespoir qu’est l’effet du blasement, nous devons nous simplifier et reprendre confiance das la spontaneité du coeur." (Jankélevitch, p.183)

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Fogo: uma expressão do desejo.


Dos deuses tu foste arrebatado,
Ocultaram isso que não mais se mostra:
serenidade,

alegria e ainda sorrisos.
Nas cinzas há também a chama,

potência...
Entusiasmada energia,
apaixonado habitar.
Quisera estar aí,

intensa...
vida consumida, desgastada,
inebriante fluidez.
Eis aí o devir: mutante,
renovado desejo.
Desmedida esperança,
sou fênix...

alhures endereçada.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Croire en Dieu après Auschwitz ?

Acreditar em Deus depois de Auschwitz?




“O perdão não é aplicável aos que se rebolam no contentamento da sua boa consciência, ou para os agressores que não estão arrependidos.” (Vladimir Jankélévith)

Assim como não é possível provar racionalmente a existência de Deus e do sobrenatural, é igualmente impossível provar a sua inexistência. Um agnóstico, nesse sentido, pode ser tanto teísta quanto ateísta, ou seja, crer por “fé” em um Deus ou, contrariamente,assumir não ter “conhecimento” da existência de Deus. A crença, enquanto fé, para o entendimento humano é algo que inicialmente pode se mostrar como um escândalo precisamente por que é paradoxal.
Isso não é necessariamente um problema quando a ironia se torna uma boa consciência que pode se dinstinguir da hipocrisia. Aqui, talvez, a ironia de que nos fala Jankélevith:

“Pour comprendre la fonction de l’ironie, il nous faut comprendre la duplicité de la conscience, en d’autres termes la disjonction qui ne cesse de s’agraver entre l’esprit et les signes de l’esptrit.” (...) “L’ambiguïté de l’Apparence, toujours moyenne entre l’Être et le Non-Être, nous inspire une salutaire méfiance qui est, on le verra, l’ABC de l’ironie.”(p.52s) (Para compreender a função da ironia, temos de compreender a duplicidade da consciência, em outras palavras, a disjunção que não cessa de se inscrever entre o espírito e os sinais do esptrito.” (...) "A ambigüidade da aparência, sempre mais ou menos entre ser e não-ser, inspira uma desconfiança saudável é, discutido, o ABC de ironia."

Referência:
JANKÉLÉVITCH, Vladimir, L’Ironie, Flamarion 1964.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Laura Pausini - Nei giardini che nessuno sa

Canção de Renato Zero, dedicada àqueles que não vemos...




(...)Te daria meus olhos para que você veja aquilo que não vê,
A energia, a alegria pra conseguir ainda sorrisos.
Diga sim, sempre sim e para conseguir alçar um vôo
Pra onde quiser, pra onde souber
Sem aqueles pesos no coração.
Esconda nas nuvens aquele inverno que te faz mal,
Cure as feridas e depois
Algum dente a mais pra comer.
E depois se olhe sorrindo,
E depois se veja ainda correndo.
Esqueça, há quem esqueça
Distraidamente uma flor,
Um domingo.

E depois silêncio,
... e poi silenzi...



[...] Sim, vai ainda uma vez ao encontro dos mortos, para desse lugar olhar a vida de frente... (KIERKEGAARD,p.66, 2004)

KIERKEGAARD, Sören Aabye. . Do desespero silencioso ao elogio do amor desinteressado: aforismos, Novelas e Discursos de Sören Kierkegaard. Organizador, tradutor e apresentador: Álvaro Luiz Montenegro Valls. Porto Alegre: Escritos, 2004.

domingo, 22 de maio de 2011

O horizonte: sempre ele mesmo, um horizonte?

Enquanto ele mesmo, isto é, sempre alhures, o horizonte pode ser a consciência da própria incompletude; Sendo consciência, parece suscitar em nós o desejo enquanto pulsão de vida. Inesgotável, aliás, pois tão logo alcançamos um objetivo, lá está ele novamente, o desejo, à luz do que parece um novo horizonte. Há aqui a possibilidade de criação da vida enquanto arte.
Nesse sentido, enquanto reflito sobre mim mesma, ou seja, quando olho para a própria interioridade, o que vejo é que há um rasgo cujo indizível me lança para uma espécie de aspiração para o infinito. Aliás, a ideia de felicidade parece estar mesmo ligada ao ideal de completude.
Mas será possível pensar o finito no infinito? Posso pensar que o infinito contém o finito? E o contrário: o finito contém o infinito? Neste ponto, Kierkegaard talvez afirmasse que “fazer contabilidade com uma grandeza infinita é impossível, pois calcular é exatamente tornar finito.”
Como, então, pensar o infinito sem recorrer alhures? Para a razão, esta questão parece mesmo um “escândalo”.
Por outro lado, talvez, paixão seja mesmo isto, quero dizer, perseguir entusiasmadamente os próprios sonhos distinguindo neles sua inexaurível fonte. Reconhecer os limites da própria razão pode ser, para alguns, escândalo, mas é também escolha.
Por outro lado, é preciso lembrar que a paixão, quando exacerbada, tem uma característica absoluta, quero dizer, egoísta, pois ela sempre exclui o outro. Sendo assim, ela oculta em si mesma a porção de sofrimento (toda paixão requer também o sofrimento) e se deixa ver apenas enquanto ideia de completude. Acaso quando nos apaixonamos o mundo inteiro não nos parece perfeito?
Enquanto reflito sobre mim mesma, meus sonhos, projetos e desejos, a liberdade parece mesmo possível, mas quando observo com sincera honestidade percebo que é ainda amor próprio unicamente. Ora, quanto as minhas próprias escolhas, já não tenho dúvidas de que sou e serei sempre responsável. Mas a liberdade, nesse sentido, pode tornar-se meramente unilateral. A questão que proponho pretende ir um pouco além, quero dizer, a possibilidade de liberdade diante do outro. A questão se torna complexa quando dou conta de que sempre há um outro que me interpela e que, por sua vez, também me faz responsável. É neste ponto que a questão da liberdade parece mesmo ficar enredada.
Pensar que há no outro a mesma dimensão de incomensurabilidade, algo que está sempre alhures, quero dizer, pressupor que há também no outro o mesmo desejo de infinito, faz questionar sobre a idéia que tenho da liberdade enquanto possibilidade.
O fato é que precisamos escolher e, mesmo que não saibamos, somos e seremos sempre responsáveis. A questão não é apontar aqui para o que seja “moralmente correto”, isto é, distinguir entre o certo e o errado, mas sim pensar a ação como uma questão de consciência. Não importa qual seja a escolha, seja ela uma decisão enredada, tolhida, ou ainda unilateral, será sempre uma possibilidade de liberdade.
Em que sentido, então, a liberdade enquanto possibilidade é mesmo sempre tolhida, embaraçada? Se a decisão é sempre individual, então preciso acreditar em uma “verdade”, mas se essa verdade é minha, em que sentido ela se torna individualista?
Aqui, podemos pensar no pressuposto kierkegaardiano de que “uma verdade que seja verdadeira para mim” soa meramente individualista quando retiramos dele a dimensão paradoxal, ou seja, essa aspiração que sentimos para o infinito, um desejo de plenitude que não cessa de se inscrever e que a razão não dá conta de pronunciar.
Nesse sentido, pensar a liberdade diante desse outro que inevitavelmente me interpela, parece requerer sempre um olhar de acolhimento. Acolhimento que somente é possível mediante um “recolhimento” inicial, pois a consciência do desejo que há em mim, já não me faz diferente do outro, ao contrário, sob este aspecto, somos exatamente iguais. E a igualdade está precisamente na dimensão incomensurável.

...

sábado, 21 de maio de 2011

Segunda ética: a dialética da comunicação ética e etico-religiosa.

Em 1847, Kierkegaard publica "As Obras do Amor"; considerações em formas de discursos que apontam para o que seria a proposta de uma segunda ética: o amor enquanto prática. Conforme Valls, (...) "O amor cristão é comparado com o amor apaixonado platônico e a amizade aristotélica. O poeta elogia o amor apaixonado, sem saber como e por que o amor precisa transformar-se em dever." Amar a si mesmo é natural, mas há um acréscimo: ama a teu próximo "como amas a ti mesmo." Aqui, uma possibilidade de vencer o egoísmo, pois o outro não é o segundo eu, mas sim o "primeiro tu". Sob este aspecto, o amor é maior do que a fé e nesse sentido, só ele permanece... dialética do amor enquanto possibilidade ética.



Sobre esta obra, tive a oportunidade de elaborar um estudo mais detalhado e específico em que buscava aproximações com O Idiota de Dostoiévski. Deste estudo, fonte de minhas pesquisas para a monografia, publiquei um artigo e, posteriormente, postei aqui no blog sob o título: Idiota? das correlações arquetípicas à perspectiva filosófica - Kierkegaard e Dostoiévski;


Minha proposta hoje é partilhar um pouco da primeira série do livro, em que Kierkegaard dá início as suas considerações:



Prière

Comment pourrait-on parler convenablement de l’amour si l’on T’oubliait, ô Dieu d’amour, de qui procède tout amour dans le Ciel et sur la Terre, Toi qui n’as rien épargné, mais qui as tout donné dans l’amour, Toi qui es amour, si bien que celui qui aime n’est ce qu’il est qu’en étant em Toi! Comment pourrait-on parler convenablement de l’amour si l’on T’oubliait, Toi qui as révélé ce qu’est l’amour, ô notre Sauveur et notre Rédempteur, qui T’es donné Toi-même pour sauver tous les hommes! Comment pourrait-on parler convenablement de l’amour si l’on T’oubliait, Esprit d’Amour, Toi qui ne réclames rien de ce qui est à Toi, mais qui rappelles le sacrifice de Celui qui fut amour, Toi qui rappelles au croyant d’aimer comme Il est aimé et d’aimer son prochain comme lui-même! O Amour éternel, Toi qui est partout présent et qui Te manifestes toujours lorqu’on T’invoque, ne sois pas non plus sans témoignage dans ce que l’on dirá ici de l’amour ou des oeuvres de l’amour, Car elles sont vite comptées, certes, lês oeuvres que Le langage humain appelle spécialement et bien petitement lês ouevres de l’amour; mais au Ciel, nulle oeuvre ne peut être agréable si elle n’est une oeuvre de l’amour, sincère dans la renonciation à soi, répondant au besoin de l’amour et, pour cette raison justement, sans prétention de mérite!



KIERKEGAARD, Sören. Les Oeuvres de l’amour – La dialectique de la communication éthique et éthico-religieuse ; Traduction de Paul-Henri Tisseau et Else-Marie Jacquet-Tisseau ; Oeuvres Complètes, Éditions de L’orante, 1980.



Oração
Como se poderia falar corretamente do amor, se Tu fosses esquecido, ó Deus do Amor, de quem provém todo o amor no céu e na terra; Tu, que nada poupaste, mas tudo entregaste em amor; Tu que és amor, de modo que o que ama só é aquilo que é por permanecer em Ti! Como se poderia falar corretamente do amor, se Tu fosses esquecido, Tu que revelaste o que é o amor; Tu, nosso salvador e reconciliador, que deste a Ti mesmo para libertar a todos! Como se poderia falar corretamente do amor, se Tu fosses esquecido, Espírito de Amor, que não reclamas nada do que é próprio Teu, mas recordas aquele sacrifício do Amor, recordas ao crente que deve amar como ele é amado, e amar ao próximo como a si mesmo! Ó, Amor Eterno, Tu que estás sempre presente em toda a parte e nunca deixas sem testemunho quando Te invocam, não deixa sem testemunho aquilo que aqui deve ser dito sobre o amor,ou sobre as obras do amor. Pois decerto há poucas obras que a linguagem humana,específica e mesquinhamente, denomina obras de amor; mas no Céu é diferente, aí nenhuma obra pode agradar se não for uma obra de amor:sincera na abnegação,uma necessidade do amor,e justamente por isso sem a pretensão de ser meritória!




KIERKEGAARD, Sören; As Obras do Amor - Algumas considerações cristãs em forma de discursos; Tradução de Alvaro L.M. Valls e revisão de Else Hagelund; Editora Vozes, 2005.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Poeta 2


Por que a perene fuga às montanhas,
Trilhando estradas íngremes e duras?
- Não fica ao chão de insípidas campanhas
O poeta - apenas vive nas alturas.
(Professor Nedel, 2009)

"Há um cansaço do pensamento banal" (Alvaro Valls. Zero Hora. Cultura, 15 jul.2006).


NEDEL, José. A curvatura da razão; Porto Alegre, 2009

domingo, 8 de maio de 2011

Inversão: a grande ironia

No que se refere ao pressuposto ético que diz respeito aos direitos e deveres que são meus, hoje a lógica parece mesmo invertida: enquanto os outros têm deveres, eu tenho somente direitos...
A grande ironia é que sempre há argumentos em que penso não apenas justificar como também convencer os outros e até a mim mesma, “razões” que isentam da responsabilidade que também “deveria” ser minha (?!) ...
o grande impasse: eis aí um modo prático de tentar justificar meu ódio diante da própria impotência, talvez, daquilo que não sou capaz de dar conta. Aliás, desespero é mesmo isto, quero dizer, é quando não mais amando a mim, duvido de tudo, dos outros, do mundo e até de mim mesma... e ao duvidar de tudo acabo perdendo, quiçá tenha algum dia encontrado, a paixão.


Nas "Migalhas Filosóficas" Kierkegaard fala um pouco a esse respeito: "Mais il ne faut pas penser de mal du paradoxe, passion de la pensée: le penseur sans paradoxe est comme l'amant sans passion, une belle médiocrité." (Mas não devemos pensar mal do paradoxo, a paixão do pensamento: e o pensador sem um paradoxo é como o amante sem paixão, uma grande mediocridade (um tipo medíocre)".


KIERKEGAARD, Sören, Miettes Philosophiques; Oeuvres Complètes, ed. de l’Orante, trad. Tisseau, v. 7, p. 35